Translate

segunda-feira, 30 de junho de 2014

Casamento na Coreia do Sul – Cerimônia

Depois de mais de seis meses sem nenhuma atualização, tenho que pedir desculpas, mas, além de ocupada, não estava muito animada para escrever. Agora que voltei para uma temporada no Brasil, tomei coragem para retomar os posts. E, nesse tempo, tanta coisa aconteceu. Terminei três níveis do curso de coreano, ganhei bolsas de estudo por ficar entre os melhores alunos da turma, casei (no civil) no final do ano passado com o coreano com quem já namorava há quase quatro anos, assim que ele conseguiu um emprego na Nigéria e foi para lá em janeiro e, depois disso, fiquei morando apenas com meus sogros.

Sessão de fotos pré-casamento, trajando 한복 (hanbok), veste tradicional coreana
Foto: Poem Photography
Um dos fatos mais recentes, no entanto, foi a minha cerimônia coreana de casamento, realizada no dia 7 de junho na cidade de Daejeon. E decidi compartilhar com vocês como aconteceu tudo, desde a escolha da data até os detalhes da “festa” (assim mesmo, entre aspas) e comparar um pouco com o que é no Brasil. Para quem não sabe, numa tentativa de ocidentalização, os coreanos vêm mudando um pouco algumas tradições. Primeiramente, vou levantar alguns pontos importantes para que seja fácil para um brasileiro entender todo o processo de casamento na Coreia:

- Atualmente, as cerimônias de casamento coreanas acontecem, em sua maioria, em “wedding halls” ou salões de casamento modernos, que geralmente são em hotéis ou em prédios próprios para isso. Embora o número de cristãos seja cada vez maior na Coreia, eles mantêm esse padrão, diferentemente do Brasil, onde há uma tradição de se casar na igreja e depois fazer uma festa em um salão. Mas não adianta tentar comparar nossos salões de festa com os coreanos. Eles são muito diferentes.


Salões de casamento: em prédio próprio (cima) e hotel
Fotos: Ariane Rodrigues

- Os wedding halls padronizam, geralmente, pacotes fechados, em que tudo está incluso. Se você quiser tirar algo, eles vão continuar cobrando o mesmo preço. No local onde eu casei, o valor já englobava até a sessão de fotos pré-casamento, também conhecida como 웨딩촬영 (wedding tchalyong), mas eu podia escolher entre quatro opções de estúdios que eles tinham disponível (uma das fotos segue abaixo). Além disso, estava incorporado ao pacote: o aluguel do vestido e do terno, o bolo, o buquê, a maquiagem da noiva e do noivo, os tickets para o restaurante, além das comidas especiais a serem utilizadas durante o 폐백 (pyebaek), que é a cerimônia especial coreana em que os noivos se curvam para os familiares mais velhos e que acontece depois da parte “moderninha”, mas quase ninguém participa.


Foto: Poem Photography
- A escolha do dia do casamento não é aleatória. Muitos coreanos acreditam que existe uma data auspiciosa para isso. Por isso, é comum eles procurarem cartomantes ou videntes que dizem quais são os dias bons para casar. Como meu noivo trabalha na Nigéria e só tem férias de três em três meses, eu queria marcar para maio a nossa cerimônia. Seria ótimo para ele e para mim, porque meu curso de coreano acabava justamente na metade desse mês. A questão surgiu quando minha sogra procurou a cartomante e veio a resposta: não existia data legal para casamento em maio. Teria que ser em junho. Como eu não queria criar problemas, aceitei numa boa.

- Casamento na Coreia é sinônimo de lucro. É uma oportunidade da família do noivo “recuperar o investimento” feito ao participar das cerimônias de filhos de amigos e familiares, além de cobrir os custos da “festa”. Isso porque os coreanos se presenteiam com dinheiro (dentro de um envelope branco), que, por um padrão deles, é geralmente de 30 mil wons (uns 60 reais) para colegas de trabalho, ou 50 mil wons (cerca de 100 reais) para quem não é tão íntimo e um valor que chega até 1 milhão de wons (2 mil reais), no caso de parentes ou amigos muito próximos. É por isso que a lista de convidados geralmente é organizada pelos pais dos noivos e a maioria das pessoas presentes na cerimônia é desconhecida para o casal. Para quem tem curiosidade sobre valores, nós gastamos mais ou menos uns 10 milhões de wons (20 mil reais) no total e recebemos dos mais de 250 convidados o equivalente a 20 milhões de wons (40 mil reais), ou seja, o dobro. Mas eu também ganhei presentinhos fofos dos meus amigos chineses:

Foto: Ariane Rodrigues

- Esqueça a ideia de “festa de casamento”. O lema na Coreia é ser rápido e, como eles mesmos dizem, o negócio é ir, dar o dinheiro, comer e ir embora. Diversão é coisa de nós brasileiros e outros ocidentais. As cerimônias coreanas acontecem geralmente num sábado, começando entre 11h30 e 14h30 (como mostra as fotos abaixo). E a duração total é de, no máximo, 30min. Logo depois, os convidados seguem para o restaurante que fica dentro do wedding hall, onde tem um bufê liberado. A maioria nem consegue falar com os noivos, porque esse restaurante normalmente é compartilhado com todos os convidados dos outros casamentos daquele dia, que dependendo do porte do local, pode ter até umas dez cerimônias acontecendo ao mesmo tempo ou em horários seguidos. Na entrada do hotel, para os convidados não se perderem, fica uma informação sobre o salão onde será realizado cada casamento, com os nomes e/ou fotos do casal:  


Fotos: Ariane Rodrigues

- Na Coreia, não existe o mesmo suspense para a entrada da noiva como é no Brasil. Na verdade, o noivo geralmente escolhe o vestido junto com a mulher. E, quando contei sobre essa tradição brasileira, os coreanos acharam estranho o fato de que talvez as roupas dos dois não estejam combinando durante a cerimônia (mesmo que eu ache que terno SEMPRE vai ficar bem com qualquer vestido). E, como tudo começa no início da tarde, o casal tem que chegar umas 7h da manhã para se preparar e acaba que o "dia da noiva" brasileiro acontece dentro do próprio wedding hall, onde ela fará cabelo, maquiagem e colocará a roupa juntamente com os outros noivos daquela data e os familiares de todos eles. Além disso, existe uma salinha de espera onde a noiva fica sentada num tipo de "trono", a partir de uns 30min antes do casamento, como se fosse uma princesa. Daí, os convidados entram para cumprimentá-la, dizem como ela está bonita, tiram algumas fotos juntos ou ficam batendo um papo antes de começar o evento.


Foto: Jerry Choi (o noivo)

- A cerimônia coreana geralmente é dirigida por um orador do wedding hall, mas isso pode ser modificado dependendo da religião ou do interesse do casal. É possível convidar pastores, padres, monges budistas, qualquer líder, religioso ou não. Hoje em dia, como o número de evangélicos e protestantes tem sido crescente no país, a maior parte delas conta com a participação de pastores. Além do orador, também há um cerimonialista, que, no nosso caso, foi a irmã do meu marido, que é garota do tempo na SBS, uma das grandes emissoras da TV coreana.


Na primeira foto, o orador e, na segunda, os pais, a irmã e o cunhado do meu marido 

- Embora tudo tenha que ser rápido, existe um padrão. Começa com uma apresentação do cerimonialista sobre o casal, seguida da entrada do noivo sozinho e da noiva com o pai. No nosso caso, entramos juntos, porque meu pai não pôde estar presente. E a marcha, com ou sem música, é quase uma corrida. Na maior parte dos casamentos, não existe a figura dos padrinhos, algo diferente do Brasil. Depois, o orador faz um discurso (incompreensível para mim), uma pessoa canta uma música para o casal, os noivos cortam juntos, com uma faca que parece espada de samurai, um bolo que só eles vão comer (e os convidados ficam babando). Eu fiz um mini discurso para o pessoal ver que eu sei falar o idioma deles e, antes da nossa saída, meu marido gritou três vezes: “Ariane, tá bom”, em referência ao uso que os coreanos fazem dessa expressão brasileira, com significado bem parecido com o nosso.

- Assim que os noivos saem, eles têm que voltar para uma sessão de fotos e registrar a presença dos convidados. Começa com o casal sozinho para depois entrarem os familiares (pais e irmãos), a que se juntam os outros parentes mais tarde (tios, primos, avós, etc). Por último, os amigos dos noivos se reúnem e, além disso, o fotógrafo pede para simular algumas ações para as fotos. Por exemplo, ele pergunta quem vai pegar o buquê e então a noiva joga as flores para trás e essa pessoa segura e depois devolve para as mãos da noiva, que continua a fazer poses. Seria bem parecido com o Brasil, se não fosse pela ausência do simbolismo de que essa seria a próxima mulher a se casar.


Foto de cima: jogando o buquê para a Mirella (brasileira que conheci na Coreia) pegar
Foto de baixo: só os parentes do meu marido (e ele disse que não tem nem metade)

- Enquanto todos os convidados se dirigem para o restaurante, os noivos correm para trocar de roupa, colocar o 한복 (hanbok), veste tradicional coreana, e começa o 폐백 (pyebaek), uma cerimônia à parte, que só fazem parte os familiares do casal.  Há vários ritos que precisam ser seguidos, como os noivos ficarem ajoelhados um de frente para o outro, fazer “love shot”, a mulher segura uma tâmara com a boca e o marido tem que tentar tirar. Os pais do noivo atiram nozes e tâmaras e a noiva tem que segurar tudo com a roupa e, quanto mais conseguir pegar, mais sorte terá o casal. Além disso, os anciãos da família se sentam e os noivos têm que servir uma bebida alcoólica, enquanto eles comem algum dos itens disponíveis na mesa, como um bolo de arroz chamado  (tteok), nozes, amêndoas, tâmaras, entre outras coisas. Depois de se curvar para os familiares, eles dão um dinheiro extra para a lua-de-mel, como se fosse a "gravata" brasileira. Basicamente, acontece tudo como no vídeo a seguir (eu fiz quase do mesmo jeito, ou deveria fazer):


-----------------
Esse foi um resumo de como é um casamento na Coreia. Dei mais o ponto de vista dos noivos, porque é o que eu conheço mais. Como espectador, talvez o relato fosse um pouco diferente. Espero que tenham gostado e, ainda essa semana, vou preparar mais um post sobre a sessão de fotos pré-casamento, que todo mundo adorou e foi a minha parte favorita de todo o processo. Depois, escrevo sobre o casamento civil, que é muito mais barato e menos burocrático que no Brasil. Até a próxima!