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sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Como arrumei um marido coreano – nossa história

Toda vez que digo que meu marido é coreano, as pessoas logo ficam curiosas para saber como a gente se conheceu, em que idioma se comunica, entre outras coisas. Nossa história é um pouco inusitada e só deu certo por muito esforço de ambos (mais dele do que meu, na verdade). Hoje, dia 15 de agosto, a gente completa cinco anos desde nosso primeiro bate-papo online e três anos que nos encontramos pessoalmente pela primeira vez. Para comemorar esse marco, fiz uma retrospectiva da nossa biografia e vou contar isso por meio das perguntas mais comuns que eu escuto de amigos e até desconhecidos:



Como vocês se conheceram?
Quem nos uniu foi a Internet, em agosto de 2009, assim que eu comecei o curso de japonês no CLAC da UFRJ. E foi uma super coincidência, porque eu simplesmente estava querendo praticar mais a língua e digitei no Google: “aprendizado de idiomas gratuito”.  A primeira opção que apareceu foi o Live Mocha, uma rede social em que falantes nativos da língua que você quer estudar corrigem seus exercícios e interagem com você.
Depois de uns cinco dias de uso, conheci muita gente nova, com quem falava mais em inglês do que japonês (até porque eu ainda era iniciante neste último). E, dentre os japoneses, chineses, americanos, britânicos, argentinos, indianos e quenianos, estava o Jerry, único coreano da lista. Ele é graduado em japonês e havia morado no país por um ano. Além disso, estava indo fazer um intercâmbio na Inglaterra em alguns meses. Por isso, queria me ajudar e, ao mesmo tempo, praticar inglês.

Mas por que aprender japonês?
Uma pessoa que certamente influenciou nisso foi minha amiga de faculdade, Rafaela. Até 2007, eu não tinha nenhum interesse pelo Oriente. Só tinha visões estereotipadas e considerava nerd todo mundo que gostava de animes, mangás e cultura japonesa. Mas, depois que essa amiga me apresentou as novelas orientais, chamadas de doramas, comecei a ter uma profunda admiração, primeiramente pelos japoneses e, mais tarde, por taiwaneses, coreanos e chineses. Então, assim que terminei o curso de espanhol, corri para aprender japonês. Da parte dele, quem indicou o Live Mocha foi um amigo, nosso outro cupido.

E como esse relacionamento saiu da Internet?
Depois de conversar por uns seis meses, percebemos um interesse maior um pelo outro, mesmo que fosse um relacionamento apenas online. A gente se falava diariamente e confidenciávamos as partes boas e ruins do nosso dia. Ele, com as dificuldades e aprendizados do intercâmbio e eu, com meu curso de japonês, trabalho (na época com tradução), faculdade de Jornalismo e assuntos diversos. Depois de mais ou menos um ano, passamos a nos corresponder por cartas e até a enviar pequenos mimos de presente (fotos). Ele me pediu em namoro e eu aceitei, mas, ao mesmo tempo, tinha medo de que não passasse da Internet.

Primeiro presente que recebi dele, antes de nos conhecermos pessoalmente

Mimo  recebido no Valentine's Day
Presente de Natal que eu mandei

No início de 2011, depois de economizar bastante, resolvi que faria, em agosto, minha primeira viagem internacional para Madri, capital espanhola, durante a Jornada Mundial da Juventude (JMJ), evento católico. Quando avisei a ele, ficou tão animado porque seria a oportunidade ideal para a gente se encontrar, e, mesmo que ele não seguisse a mesma religião, participou de tudo comigo. A expectativa do evento e, ao mesmo tempo, de encontrá-lo, era grande. E isso aconteceu no dia 15 de agosto, que coincidentemente também era a data em que começamos a nos falar pela Internet.

Nossa primeira foto juntos

Em Madri, quando nos conhecemos pela primeira vez 

O que seus pais achavam disso?
                Minha mãe sempre foi muito incentivadora de meus relacionamentos online. Com 15 anos, eu conheci meu primeiro namorado pela Internet e ela participou de todo o processo desde a ler minhas conversas com ele até me levar para Volta Redonda, cidade onde ele morava, para conhecê-lo pessoalmente. Em relação ao Jerry, eu tinha contado sobre ele, mas nesse caso, ela ficou um pouco mais apreensiva por ser estrangeiro, não conhecer aspectos culturais do país e, principalmente, pela distância.
A primeira vez que recebi uma correspondência dele lá em casa foi tão engraçado que meus pais acharam que era uma bomba (ainda mais que a caixa estava cheia de escritos em coreano, que, para eles, eram algum código mortífero ou sei lá o que). Minha mãe disse que a gente só abriria na praia de Saquarema e, qualquer coisa, tacava no mar. Mas eram apenas chocolates e doces, para a nossa alegria!

A "bomba" enviada por ele

Quando nos encontramos pessoalmente, em Madri, tinha medo de que eles não me deixassem ir se eu contasse que ele iria estar lá. Então, só dei a notícia para meus pais no dia em que estava partindo. Eles ficaram meio chateados comigo pela falta de confiança, mas, depois, me perdoaram. Até receberam ele na minha casa no ano seguinte e em 2013, nas quatro vezes em que ele veio para o Brasil.

No Pão de Açucar


Marquês de Sapucaí durante o Carnaval carioca

Em que idioma vocês se falam?
Embora eu esteja aprendendo coreano e ele português, ainda nos comunicamos basicamente em inglês. Mas, com os meus sogros, sou obrigada a falar coreano e ele tem que se virar no português para entender minha família.

Depois do primeiro encontro, como continuaram com esse relacionamento à distância?
Ficamos juntos por uns dez dias em Madri, participando do evento. Depois disso, ele voltou para a Coreia e eu vim para o Brasil. No mês seguinte, ele começou a trabalhar num projeto da Hyundai em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes. E, como tinha direito a férias de três em três meses, resolveu passar esse tempo no Brasil para passear e estudar português. A empresa pagava pela passagem aérea, o que fazia com que a viagem não saísse tão cara.

Natal em família na minha casa

Passeio para Saquarema, Região dos Lagos (RJ)

Escadaria Selaron na Lapa (RJ)

MAC em Niterói (RJ)

Desde nosso segundo encontro, ele me deu um anel de noivado e decidimos casar em um ano ou dois. No final de 2012, ele se demitiu da Hyundai com planos de morar no Brasil. E, antes disso, planejamos uma viagem para eu conhecer a Coreia. Ele foi um fofo, saiu de Abu Dhabi, veio me buscar em casa (loucura) e partimos para o país dele, onde fiquei hospedada na casa dos meus sogros por quase um mês. Depois, voltamos juntos para o Brasil.

Anel de compromisso que ele me deu em Madri

Em Dubai, durante conexão para Coreia
O problema é que o verão carioca e a nossa comida extremamente salgada fizeram mal a ele. Ele decidiu, então, ir para a Coreia, com data marcada para voltar ao Brasil em junho de 2013. Foi quando começamos a agilizar o nosso casamento. Mas a morte da minha mãe, em agosto, nos deixou abalados e ele me chamou para passar um período na Coreia, estudar em alguma universidade de lá e depois voltar para terminar minha faculdade no Brasil.


Estúdio de Jornalismo da SBS, emissora coreana onde minha cunhada trabalha

Cadeados na Seoul Tower

Passeio para Kyoto, Japão

Quais são os planos para o futuro? Brasil ou Coreia?
Talvez, nenhum dos dois. Agora que casamos, ele está trabalhando na Nigéria (é isso mesmo, onde estão acontecendo casos do vírus ebola), e, como eu não podia ir com ele, estou de volta ao Brasil para me formar em História e depois voltar para a Coreia. Temos planos, no entanto, de morar em algum outro lugar, provavelmente Canadá ou Austrália, mas vamos esperar as oportunidades que surgirem. Como ele tem muita experiência de trabalho no exterior, não deve ser tão difícil.

Sessão de fotos do nosso casamento


Lua de mel em Boracay, Filipinas

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Essa foi basicamente nossa história. Depois, faço outro post sobre algumas curiosidades em relação a choques culturais da relação entre pessoas de dois países tão diferentes, como por exemplo, mancadas que cometemos um com outro por falta de conhecimento das tradições e costumes de cada um. Temos muitos casos engraçados e constrangedores, mas vou deixar para falar disso em outro momento.

domingo, 10 de agosto de 2014

Dia dos Pais na Coreia - pai e mãe

Como hoje é dia dos pais no Brasil, algumas pessoas ficam curiosas para saber se a data se repete em outros lugares do mundo. Na Coreia, eles não comemoram separadamente um dia para mães e pais, mas sim um dia dos dois, que acontece sempre em 8 de maio, que não é considerado feriado (até porque há dois feriados seguidos nos dias 5 e 6 de maio, com o Dia das Crianças e o Aniversário de Buda). Então, no Eobeoi Nal (어버이날), como chamam os coreanos, os filhos homenageiam aqueles que os educaram e/ou deram a vida a eles dando flores – cravos vermelhos, para ser mais específica.


                Este ano, como estava na Coreia, pude ver de perto como se celebra essa data. Para presentear meus sogros, fui caçar onde comprar os tais cravos vermelhos e percebi que era mais fácil do que eu pensava. Tanto no meio da rua quanto em lojas (cafeterias, mercearias, entre outros), havia pessoas vendendo vários tipos de kits fofos contendo essas flores verdadeiras ou de plástico. Escolhi dois vasinhos  (foto anterior) e, como esse ano o aniversário lunar do meu sogro caiu no mesmo dia, também comprei um bolo para comemorar (embora ele não goste muito de doce e de nada muito artificial, na verdade).


Por que dia dos pais e das mães ao mesmo tempo?

O Dia dos Pais coreano existe desde 1930. Com a chegada de comunidades cristãs ao país, combinada à tradição confuciana da Coreia, surgiu a necessidade de celebrar uma data para a família. Foi a partir de 1956 que foi estabelecido o 8 de maio como Dias das Mães. Vinte anos depois, no entanto, houve uma discussão para que, em vez de ser um dia só dedicado às mães, que fosse para ambos os pais. E, no início, a ideia era que a semana toda fosse em respeito aos mais velhos e ancestrais, mas, então, isso foi modificado de forma que hoje maio é considerado o mês da família, sendo o dia 8 especialmente feito para os pais.

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Mas, como hoje é dia dos pais só no Brasil, desejo uma ótima data a todos os brasileiros, especialmente ao meu, que agora também é vovô e aparece na foto com meu sobrinho.

Foto: Henrique Barreto

sexta-feira, 1 de agosto de 2014

Churrasco: a comida brasileira na Coreia

Quando estamos em um país diferente, geralmente procuramos por algo que faça com que nos sintamos em casa. E a preocupação de muitas pessoas é em relação à comida. Tem gente que não se adapta a uma nova cultura mais por sua culinária do que por outros motivos. Realmente, essa é uma parte muito importante da adaptação de um estrangeiro. E, depois de uns três meses na Coreia, eu já estava sentindo falta do meu açaí, guaraná e de vários pratos brasileiros. O problema era que ficava sem graça de cozinhar, por morar com os sogros. Então, minha solução foi caçar pelos restaurantes brasileiros na cidade. Descobri dois em Daejeon, mas ambos eram rodízios de carne (muito caros). Procurando em municípios vizinhos, o resultado era basicamente o mesmo. Cheguei à conclusão de que comida brasileira na Coreia era sinônimo de churrasco (슈하스코).


Saladas coreanas servidas numa churrascaria rodízio brasileira
No entanto, como a maioria de restaurantes estrangeiros, a pessoa não pode esperar encontrar tudo exatamente do mesmo jeito que em seu país. Aliás, os chineses ficam muito frustrados quando vão a algum estabelecimento na Coreia que deveria servir pratos comuns a eles. A maioria não consegue se sentir à vontade, porque são comidas que não existem na China ou em diversas províncias de lá, como o jajangmyeon (자장면). Quando eles forem para o Brasil, a decepção deve ser ainda maior, coitados, já que yakissoba é japonês e frango xadrez definitivamente não é servido à moda deles. Enfim, voltando ao churrasco, os bufês liberados já são muito famosos na Coreia. Mas a nossa ideia de rodízio, com garçons servindo as carnes nas mesas, foi um elemento novo incorporado no estilo de restaurante brasileiro. Além disso, as saladas e acompanhamentos não são muito “abrasileirados”, embora alguns lugares incluam feijoada, farofa, entre outros. Além de também venderem guaraná, vindo do Japão (a uns 10 reais uma latinha).

Jajangmyeon (자장면): comida chinesa mais famosa da Coreia é desconhecida dos chineses
Feijão preto servido no bufê de uma churrascaria com nome de "feijoada
Latinha de guaraná vendida em restaurante brasileiro na Coreia
Em Daejeon, no final de outubro do ano passado (meu segundo mês na Coreia), abriu um rodízio brasileiro de carnes chamado Rio de Janeiro (리우 자네이루), que é minha cidade natal. Nem preciso dizer que fiquei emocionada e decidi ir correndo para conferir. Já mencionei antes aqui, mas carne na Coreia é um artigo de luxo. O quilo de um corte bovino de qualidade chega facilmente a 75 mil wons (ou 150 reais). Então, não esperava que fosse um tipo de restaurante baratinho, mas me espantei com preços muito compatíveis com o de churrascarias brasileiras. Os valores desse restaurante variavam entre 24 mil wons (48 reais), para almoço em dia de semana, e 40 mil wons (80 reais), para jantar em fins de semana. A gente pegou uma promoção desses sites de compra coletiva (T-mon, Groupon) e pagamos uns 30 mil wons (60 reais), mesmo sendo um fim de semana.


Prédio da TJB (SBS), emissora coreana onde fica o restaurante, em Daejeon

E o que me impressionou foi que todos os garçons eram brasileiros ou coreanos que moraram no Brasil. A maioria tinha experiência internacional, como esse da foto, que trabalhou vários anos na Espanha e estava me dizendo da dificuldade de aprender o idioma para poder falar o nome das carnes de forma que os coreanos entendessem. De qualquer forma, para situar os clientes, o restaurante também disponibilizava uma foto com a nomenclatura dos cortes em português e uma possível tradução para o coreano, o que é meio complicado, já que os brasileiros são muito mais específicos. Enquanto temos 20 denominações diferentes para partes do boi, os coreanos têm apenas dez, como mostram os quadros abaixo. E eu adorei minha primeira ida, já que fui a primeira brasileira a visitar o restaurante, uma semana depois da inauguração, e eles estavam me servindo super bem por isso.

Garçons brasileiros trabalham nessas churrascarias
Nomes dos 20 cortes brasileiros

Os coreanos têm apenas 10 tipos de cortes bovinos

Outra rede de Daejeon, chamada Coba Grill (코바그릴), também oferece rodízio de carnes (fotos abaixo). Essa eu nunca fui, por ser meio longe da minha casa. Fica perto da estação de trem da cidade. Pela página do estabelecimento no Facebook, é possível ver algumas informações. Eles explicam em panfletos o que é o churrasco, horários de funcionamento, localização e preços. Os valores são comparáveis ao do outro restaurante: 28 mil wons (uns 56 reais) nos dias de semana e 32 mil wons (64 reais) em fim de semana. Eles servem ainda churrasco de abacaxi, o que eu raramente vejo no Brasil e nunca comi. Fora esses dois lugares, a cidade também tem alguns restaurantes que se dizem brasileiros, mas têm nome italiano e o tipo de comida não se parece em nada com a nossa. Devem só acompanhar o fluxo. Encontrei, no mínimo, uns três assim.


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Apresentei apenas as redes de churrascaria de Daejeon, porque é onde moro na Coreia, mas sei que em Seul, Busan e outras cidades coreanas também existem várias. Na Escola Alegria, por exemplo, na capital do país, eles servem vários pratos brasileiros e tem até açaí. Aliás, esse fruto brasileiro tem se tornado cada vez mais comum na Coreia. Já achei bala, chocolate de açaí e até a polpa da fruta sendo vendida no país. Vi ainda pão de queijo em uma cafeteria da universidade de Chungnam (CNU), mesmo que o gosto seja um pouco diferente do original. Aliás, nesse mesmo lugar, as mesas são feitas com madeira brasileira e me sentia em casa. Vou deixar para mostrar isso em outro dia, que hoje o assunto era churrasco. E já está me dando fome.